O silêncio pode falar mesmo quando as palavras falham”. (Osho)
O
luto é um processo normal de elaboração diante de um rompimento de um vínculo.
Este processo se iniciará por perdas reais e/ou simbólicas, ou seja,
cotidianamente nós passamos por este processo e ele será vivenciado por toda a nossa
existência. Contudo, o luto fica mais em evidência após a morte de um ser
humano.
Possivelmente,
neste exato momento, você conheça alguém que esteja vivenciando um processo de
luto. Como na nossa sociedade moderna pouco falamos ou se quer pensamos sobre a
morte, então, em muitas situações, não sabemos o que dizer ou até mesmo como
agir diante de um enlutado. Muitas vezes, as palavras são absolutamente
ineficazes e, às vezes, no desejo de querer confortar a pessoa enlutada,
podemos dizer coisas que, na verdade, podem piorar a situação.
Quando
estamos diante de um enlutado devemos ter muito cuidado com as palavras, pois a
necessidade de dizer algo pode ser mais constrangedora que o silêncio. Uma palavra
dita inadequadamente pode ter um impacto devastador para alguém que está
vivenciando um momento de extrema fragilidade. Na minha prática clínica ouvi
muitos pacientes comentarem sobre frases que lhes foram ditas e que não lhes
ajudaram em nada. Ao contrário, muitos expressaram tristeza e até mesmo raiva
por essas frases. Por isso, preparei uma lista de frases para que possamos
refletir sobre o que não dizer a um enlutado.
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Quando uma pessoa morre após um longo período de internação por doença sem
possibilidade de cura:
“Pelo menos ele(a) agora não
está mais sofrendo” – “Ele(a) agora está num lugar muito melhor que nós” –
“Deus sabe sempre o que faz” – “Tudo nesta vida tem uma razão” – “Deus não nos
dá tristezas que não possamos suportar” – “Ele(a) já tinha idade viveu
bastante”...
Estas
frases, eu as escuto desde criança e são muito marcantes. Por gentileza,
esqueça as frases clichês no seu próximo funeral.
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Quando uma mãe e/ou pai perdem um filho e estes possuem outros filhos:
“ Pelo menos você tem outros
filhos” – “Vocês são jovens e ainda poderão ter outros filhos” – “Agora ele é
uma estrelinha no céu” – “Seja grato(a) por ele ter estado em suas vidas, mesmo
que por pouco tempo” – “Ele(a) agora será mais um anjinho no céu”...
Um
dos lutos mais difíceis de serem elaborados é quando os pais perdem um filho. Então,
imaginem o que é ouvir estas frases durante o processo de luto. Para esses pais
um outro filho jamais substituirá aquele que morreu.
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Quando um homem ou uma mulher torna-se viúvo e/ou viúva:
“Você é jovem com certeza
encontrará outro companheiro(a) – “Hoje em dia tem muitos viúvos(as) em busca
de alguém”...
Cuidado,
pois a pessoa que acabou de perder seu companheiro(a) ao ouvir estas frases
pode achar que você está insinuando que aquela pessoa que morreu não era tão
amada e pode ser facilmente substituída.
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Quando transferimos para o tempo a solução de todos os problemas:
“O tempo cura todas as dores”
– “Isso leva tempo, mas não se preocupe, vai passar”...
Sim,
o tempo é algo importante. Até mesmo nós terapeutas, quando atendemos um
enlutado, precisamos saber há quanto tempo aquele paciente está em processo de
luto. Mas precisamos compreender que, quando uma pessoa perde alguém querido, a
vida demora um certo tempo para voltar ao normal. Ao ouvir estas frases o
enlutado pode ter a impressão de que há um prazo de validade para a sua dor e que
precisam se recuperar logo. Contudo, pode ser que algumas pessoas demorem uma
eternidade para se recuperarem da perda que tiveram.
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Quando queremos encorajar uma pessoa a voltar para vida cotidiana:
“Bola para frente, você
precisa sair de casa” – “Você sempre foi tão forte” – “Para de chorar, ele(a)
não fica feliz com isto de lá onde ele(a) está”...Certamente, ao dizer estas frases a pessoa está querendo de alguma forma encorajar o enlutado a retomar seu cotidiano. Mas elas podem ser prejudiciais para a elaboração adequada do luto. O enlutado pode sentir-se inibido de demostrar a sua dor e isto pode causar complicações psíquicas futuras. Talvez neste momento de profunda dor o enlutado queira mostrar a todos o quão ele também é frágil e que possui fraquezas. O enlutado precisa expressar a sua dor.
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Quando há comparações:
“Sei exatamente o que você
está sentindo, pois aconteceu comigo” – “Não sei se serve de consolo, mas o meu
caso foi bem pior que o seu, porque...” – “Nossa, eu chorava o dia inteiro”...
Cada
pessoa é única e cada qual sente e percebe as situações do cotidiano de uma
maneira. Posso afirmar que nunca alguém saberá exatamente o que o outro está
sentindo. O enlutado pode achar que a pessoa está menosprezando a sua dor.
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Quando há curiosidade:
“Mas, exatamente como ele morreu?
” – “Me disseram que ele(a) morreu de maneira trágica, como foi?”...
Não
existe nada mais inapropriado do que alguém ficar perguntando os detalhes sobre
como a pessoa morreu ao enlutado. Neste momento, caso o enlutado queira falar
sobre o ocorrido, apenas ouça. Não faça perguntas apenas para satisfazer a sua
curiosidade.
Não
tenho dúvidas de que as pessoas dizem as frases citadas acima com as melhores
das intenções, pois a maioria não sabe o que dizer num momento de morte. Com
certeza, estar ao lado de um enlutado não é uma tarefa fácil, mas devemos ter
muito cuidado com as palavras ao tentarmos “amenizar” a dor de uma perda.
Com efeito, se você estiver
com dificuldade de expressar seus sentimentos em palavras, então, diga apenas o
necessário – “Eu sinto muito pela sua
perda, meus sentimentos”. Às vezes, um forte abraço pode “dizer” mais que
mil palavras. Eu penso que uma frase interessante seja: “O que eu posso fazer para ajudá-lo?”. Pois, quando a pessoa está
em processo de luto, muitas vezes, não tem condições psíquicas para pensar nas
coisas básicas do cotidiano. Então, colocar-se à disposição para alguns
afazeres do dia-a-dia pode ser de grande valia para seu amigo e/ou familiar
enlutado.
O importante é que o enlutado
se sinta acolhido em seu momento de dor, apenas isto. Psicóloga Especialista em Luto
Referências:
Incontri D, Santos FS,
organizadores. A arte de morrer – visões plurais. Bragança Paulista: Comenius;
2007.Caderno de anotações das minhas aulas no Quatro Estações Instituto de Psicologia (SP).